O Banco Central Europeu (BCE) divulgou cálculos de cair o queixo — e capazes de deixar muitos banqueiros inquietos. Em um documento datado de 10 de outubro, o BCE alerta que, em caso de pânico financeiro, a introdução do euro digital poderia gerar uma fuga de até €699 bilhões (cerca de US$ 811 bilhões) dos bancos comerciais da zona do euro — o equivalente a aproximadamente 2,2% de todos os ativos do setor bancário.
Segundo as estimativas do BCE, esse cenário deixaria 13 dos 2.025 bancos com problemas de liquidez. Em outras palavras, a situação ainda está sob controle, mas o mercado anda um pouco mais barulhento do que o normal.
O estudo descreve dois cenários possíveis: um em que “tudo permanece calmo” e outro em que “todo mundo corre”. No segundo caso, mesmo com um limite individual de €3.000, os depositantes poderiam, em teoria, retirar cerca de €700 bilhões em busca de segurança digital, algo análogo à antiga corrida pelo ouro.
O BCE, porém, apressa-se em relativizar: esses números são exagerados, já que clientes com várias contas não poderiam sacar o valor máximo de cada uma. Até o pânico tem seus limites.
De acordo com o documento, o principal risco está concentrado em depósitos acima de €100.000 e em fundos corporativos, que representam 31% de todos os depósitos à vista. Como era de se esperar, esses clientes levam a diversificação a sério — não apenas no discurso.
Em tempos de calma, o cenário é bem menos dramático: com um limite de €500, as saídas seriam de €156 bilhões, ou 0,5% dos ativos bancários. Nada catastrófico, apenas mais um dia comum na era da digitalização financeira.
Além disso, o BCE prevê que, até 2034, a transição para o euro digital poderá gerar €127 bilhões em novos depósitos nos bancos, impulsionada pela redução do uso de dinheiro físico e pela crescente popularidade dos pagamentos eletrônicos.
O regulador enfatiza que limites de saldo no euro digital são essenciais para manter a estabilidade financeira. Sem eles, até pequenas turbulências de mercado poderiam se transformar em um colapso bancário digital em grande escala.
O documento também alerta para o risco da “dolarização digital”: se os europeus se deixarem seduzir demais por stablecoins atreladas ao dólar, a zona do euro pode acordar um dia com uma ressaca monetária, ou seja, com a perda da soberania financeira.
Um segundo estudo do BCE, publicado no mesmo dia, analisou os custos de implementação. Estima-se que o lançamento do euro digital custe entre €4 bilhões e €5,77 bilhões aos bancos, o equivalente a €1 bilhão a €1,44 bilhão por ano ao longo de quatro anos.
Mesmo assim, o BCE se mantém otimista: uma infraestrutura de TI compartilhada poderia reduzir os custos em até 30%, e os chamados “Intermediary Participation Schemes” (IPS) poderiam cortá-los em 90% a 98%.
Ou seja, o euro digital pode não sair barato, mas pode acabar organizando as contas bancárias melhor do que qualquer auditor.